Stefan Salvatore foi injustiçado. E talvez o mais doloroso disso tudo seja perceber que o motivo vai além da trama de uma série sobre vampiros. Tem a ver com a gente. Com o que a gente aprendeu, ou desaprendeu, sobre amor, sobre afeto, sobre escolha.
Porque não é só sobre The Vampire Diaries.
É sobre por que, tantas vezes, a gente prefere o personagem, fictício ou real, instável, o bad boy impulsivo, ao cara que genuinamente tenta fazer o certo. Sobre por que a gente ainda associa intensidade com amor verdadeiro, mesmo quando a intensidade vem carregada de controle, ciúmes e manipulação.
Sobre o porquê de tantas vezes o cuidado passar despercebido, enquanto o caos é exaltado como sinal de paixão.
A gente aprendeu a amar o barulho, a adrenalina. A confundir intensidade com profundidade. E quando o Damon aparece com frases afiadas, impulsos perigosos e olhos que prometem furacões, parece mais fácil cair nessa narrativa do que enxergar o valor de quem fica em silêncio tentando segurar o mundo com as próprias mãos.
Talvez porque confundiram o Stefan Salvatore com um estereótipo de "bom moço". Mas ele não era. Ele errava. Muito. Transformou o próprio irmão num ato de medo. Fugiu de si mesmo nas piores versões que podia se tornar. O Ripper de Monterey não foi só um desvio de rota, mas uma parte real dele, que ele nunca escondeu. Só tentou controlar.
E é isso que o torna humano. Mesmo sendo vampiro, Stefan carregava humanidade como quem carrega uma cicatriz que se recusa a fechar. Escolher sentir, pra ele, era um ato de coragem.
Enquanto Damon surgia como o vilão carismático, Stefan era o que se esforçava. Voltava pra Mystic Falls tentando recomeçar. Escolhia amar mesmo quando doía. Lutava contra a própria natureza todos os dias. E fazia isso sem estardalhaço.
Quando virou o Ripper de Monterey, perdeu o controle, sim, mas também sabia exatamente o que estava fazendo. Ele mergulhou no pior de si e, ainda assim, teve força pra voltar. Stefan não era inocente. Era um sobrevivente. E mais do que isso: era alguém que escolhia, todos os dias, tentar ser melhor do que o pior que já foi.
Stefan era humano. Não por ser frágil ou instável, mas porque carregava humanidade mesmo quando tudo ao redor dizia que era mais fácil desligar. Damon desligava. Damon compelía. Damon se escondia atrás do "não sinto nada" como quem fecha os olhos pro próprio reflexo. Stefan não. Stefan encarava.
Na cena em que ele está trancado na caixa dentro da represa, sendo torturado por Silas, é a lembrança da Elena que o mantém vivo. Não era só sobre sobreviver. Era sobre se lembrar do que ainda fazia sentido. Naquela ligação do bar (já consigo ouvir a drop in the ocean, a change in the weather), cambaleante, tentando resistir ao sangue e ao Klaus, ele pedia ajuda em dizer uma única palavra, mostrando toda a vulnerabilidade que ainda existia. Tudo por amor à Elena e ao Damon.
Ou quando perde a memória, e mesmo sem lembrar de nada, se apaixona por ela de novo. Porque algo dentro dele reconhecia. Não era sobre lembrança. Era sobre essência. Sobre aquilo que não se apaga.
Enquanto isso, Damon invadia quartos. Fazia jogos psicológicos. Matava, pedia desculpas, fazia de novo. Mas tudo era "justificado" pelo amor intenso que ele sentia. Um amor que queimava, mas que, ainda assim, foi vendido como romântico.
E muita gente comprou.
Por que é tão fácil amar o Damon? Porque ele é o drama. É o impulso. E a gente cresceu achando que precisava disso pra sentir algo real. É o perigo que bebe whiskey e deita no meio da estrada. É o clichê do "homem ferido" que não sabe amar, mas que no fundo só precisa ser salvo.
É assim também na vida real, né?
A gente diz que quer alguém que nos respeite, que nos ouça, que nos trate bem. Mas na prática... muitas vezes acaba escolhendo quem mais nos confunde. E depois chama isso de paixão.
Stefan foi o personagem que carregou a dor calado, que lutou com o próprio reflexo, que se sacrificou mais de uma vez. Não só no fim da série, quando literalmente deu a vida pelos outros, mas em todos os momentos em que colocou o bem-estar de quem amava acima do próprio.
Ele foi leal à Lexi. Foi irmão até quando o Damon não merecia. Foi parceiro, foi amigo, foi apoio. E, no fim, foi lido como "o sem graça". O coadjuvante. O que perdeu.
Mas será que ele perdeu mesmo?
Rever The Vampire Diaries hoje, com outros olhos, é um convite a rever também nossos próprios padrões. Por que é tão difícil aceitar um amor tranquilo? Por que o afeto que constrói parece menor do que o que nos tira do chão?
Talvez porque crescer dói. E ser amada de verdade também porque nos leva a encarar nossos medos, inseguranças, traumas e responsabilidades.
Porque amor de verdade exige escolha. Exige presença, não performance. Exige silêncio confortável, não frases de efeito. Exige alguém como o Stefan.
E talvez a gente ainda esteja aprendendo a valorizar isso.
Então, da próxima vez que alguém te perguntar se você é #TeamDamon ou #TeamStefan, pensa com carinho. Não no que fez seu coração bater mais rápido, mas no que faria ele bater em paz.
Um adendo: eu não falei nada sobre a Caroline porque gosto demais da personagem, acho ela melhor que a Elena, mas não gosto do casal. Acho que ela funcionaria perfeitamente com o Klaus ou com o Tyler e o Stefan merecia alguém que fizesse ele se sentir como se sentia com a Elena. Dito isto, quero deixar claro que também não gosto da Elena com ele porque ela não valoriza o coitado, então sou puramente TeamStefan.
Enquanto eu escrevia, ouvi em looping essa música MARAVILHOSA que me fez querer rever tudo de novo:
Passei mentalmente por todas essas cenas! E concordo, a gente ainda cai na narrativa de que o amor é caótico, machuca e é devastador, ignorando aquele que está tranquilamente ao nosso lado